terça-feira, 30 de dezembro de 2014

29 de dezembro de 2014

Fomos às compras juntas, como já não íamos há algum tempo. Mais tarde, sentadas à mesa para almoçar, ela perguntou-me:
- 2014 foi um bom ano para ti?
Fui surpreendida pela pergunta, ganhei tempo para a resposta:
- Como assim?
E enquanto se explicava pensei, tentando passá-lo rapidamente em revista.
Este ano passou a correr. Entrou lançado, cheio de (boas) emoções. Cresci - e crescemos juntos. Fui pedida em casamento - e aceitei. Fiz muitos quilómetros cá dentro, embora não tenha feito nenhuns lá fora. Fiz as malas, mudei-me e agora sinto todos os dias a tranquilidade ao passar a ponte, de vidro parcialmente aberto e cigarro na ponta dos dedos, já com o sol a descer à direita, para além do rio. Continuei a ver os meus miúdos crescer e tranquilizei-me por ver felizes também os que tive de deixar. Continuei a acreditar no projeto em que trabalho, embora não deva esquecer o futuro. Dei-me menos, dei-me pouco - e depois equilibrei-me. Gradualmente fui-me sentando menos na cadeira (não muito) confortável e continuei - continuo - a deixar que as lágrimas me escorregassem pelo rosto até ao sorriso mais abaixo. Recebi notícias que me entristeceram. Continuei a sentir a falta dos que já não estão. Vi os meus à procura de si mesmos e isso tranquiliza-me, ainda que estes processos levem o seu tempo. Caiu o primeiro dente ao meu sobrinho. O meu avô fez uma cirurgia e continua fino. Estive com os meus amigos. Estreitei laços com colegas de trabalho. Li bastante.
- Oh, sim, foi.
e depois pensei mas escrevi pouco.


(hiperligações a negrito)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

25 de novembro de 2014

Fico aqui sentada a ver o tempo a passar. Penso
- podia ligar-lhe para falarmos um bocadinho
mas depois lembro-me que isso implicaria ficar aqui sentada ou ter de aguentar o braço esticado à minha frente.
Penso que se lhe ligar vou ter tendência a olhar para a minha imagem no canto esquerdo, verificando se a minha franja se encontra composta o suficiente ou se, pelo contrário, se abriu ao meio pela falta de corte. Penso que se não olhar para a minha imagem olharei para a dela - e que o meu coração se vai apertar um bocadinho enquanto evito fazer "aquela cara".
No outro dia no trânsito - que é dos momentos, juntamente com o banho, em que mais me deixo pensar - apercebi-me mais uma vez de que tudo acontece quando tem de acontecer. Não sei se tudo, tudo mas grande parte. Por exemplo, eles nunca poderiam ter ido antes. Seria o fim do mundo em cuecas. E então, felizmente, eles não foram.
Foram vários os dias em que atravessei a ponte a caminho de sua casa, vidro aberto, cigarro na mão - longe ainda de saber que em breve este percurso passaria a ser o meu, dia após dia. Sempre achei que havia algo de tranquilizador neste percurso. O sol a pôr-se à direita, lá mais à frente, sobre a água.
Antes de ela ir para lá durante vários meses, começou por ir apenas um mês. Foi visitá-lo, foram passear. Um dia, enquanto falávamos pelo Skype, ele disse
- Temos uma coisa para te dizer
mas o
Temos uma coisa para te dizer dito com ar solene, sério. E eu perguntei a medo
- Já não voltam?
- Não - disse ele. 
Depois explicitaram. E eu desviei os olhos da câmara, desviei-os para que não vissem que brilhavam com aquele brilho molhado. E ouvi-a dizer
- Não faças essa cara.
Uns dias depois - ou talvez uns dias antes - ela disse-me que estava agora mais descansada porque sabia que não me deixava sozinha, teria sido pior noutra altura. E eu não podia concordar mais. Esta, como muitas outras coisas, aconteceu quando tinha de acontecer - ainda que eu preferisse que não acontecesse nunca.