segunda-feira, 22 de julho de 2013

22 de julho de 2013

Que outro sítio que não este? Se não fosse a crise, que outro sítio que não este?
Aqui, onde o sol é refletido pelos vidros das janelas, pelas pedras outrora brancas dos monumentos, pela calçada que é tão nossa. Que outro sítio que não este?
Desce a avenida mais cara, mãos nos bolsos, sorriso posto. Caminha com a leveza dos dias longos de verão, com a certeza de que haverá luz por várias horas. Ainda leva a mão à mala para pegar nos phones mas logo desiste da ideia. Quer ver e ouvir a cidade, absorvê-la com todos os sentidos. Os olhos levantam-se do chão e veem mais à frente: mais à frente nos rostos de quem passa, nos prédios cheios de história, no cimo das colinas. E ainda que o sol esteja forte, ainda que encadeie um pouco e os olhos se semicerrem enquadrados por pequenas rugas, puxa os óculos de sol para o alto da cabeça e observa tudo à luz da cidade. Esta luz que é dela. sem igual em parte alguma.
Pode subir e descer vezes sem conta. Percorrer durante horas a calçada. Mas quando se senta em frente ao rio, com as pernas a baloiçar sobre ele e o sol a descair já ligeiramente à sua direita, apoia as mãos atrás, estica os braços, fecha os olhos e sustem a respiração. Há um sorriso instalado que gostaria de passar a palavras. Mas quando abre o caderno preto de linhas finas sobre as pernas e pega na lapiseira amarela as palavras que ali vai deixando parecem não chegar para transmitir a grandiosidade do que este sítio gera em si.
Que outro sítio que não este? Se não fosse a crise, que outro sítio que não este? Ruas sem fim, dias longos. Línguas que se misturam por entre sorrisos longos e audíveis, por entre passos mais ou menos demorados. Colina acima, colina abaixo. Filas para os gelados, venda de fruta em cada esquina, música de rua. As bicicletas, os segways e, lá mais em baixo, quase, quase ao pé do rio, as rodas dos skates a rolarem sobre a pedra a recordarem-lhe tempos já quase antigos. E mais logo, sob a pedra da calçada, levantar-se-ão copos e copos sem fim.
Senta-se em frente ao rio e ao ver um navio que parte cheio de pessoas controla o impulso de lhes acenar, questionando-se sobre o que levam deste sítio. E questiona-se sobre o que levaram os de cá, sobre o que levaram deste sítio os que aqui pertencem, os que, se não fosse a crise, não quereriam outro sítio que não este.Mas sob a luz da cidade - sob a luz desta cidade - com as línguas a misturarem-se em seu redor, com o sol a aquecer-lhe a pele devagarinho, com os pés a baloiçarem sobre o rio e as rodas dos skates a ecoarem lá mais ao fundo, juntando-se ao som do rio que vai e que vem, talvez a crise possa deixar de existir por algum tempo. E assim sendo, que outro sítio que não este?

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