domingo, 16 de setembro de 2012

16 de setembro de 2012

Vou acumulando falsas partidas. Ouço o sinal para avançar antes de todas as outras pessoas e saio disparada em direção à meta, iniciando um longo percurso em direção a ela, tão longo que quando parto não a avisto sequer - mas sei que quero percorrer o caminho e faço-o com vontade.
Avanço, avanço depressa e com toda a energia dedicada a essa missão. Avanço tão depressa que não olho nem para trás, nem para o lado. Quando finalmente o faço, quando desvio o olhar da meta, percebo que corro e que o faço totalmente sozinha. Lá longe, lá atrás, todos continuam posicionados atrás da linha de partida, aguardando pelo sinal para avançar - o mesmo que eu julgava já ter sido dado.
Foi tempo perdido num caminho que não devia ainda ter sido percorrido, num caminho pouco seguro que não se deve percorrer a solo. Lamenta-se o desperdício, deita-se fora a motivação que crescia ao ver a meta cada vez mais próxima e arrastam-se os pés, as pernas e o corpo todo de volta à linha da partida, num passo vagaroso, num ritmo de derrota.
Vou acumulando falsas partidas. Acumulei-as já. Acumulei o suficiente para ser excluída da corrida. Agora sento-me na bancada e assisto, assisto apenas, sem grande entusiasmo, com o olhar perdido oscilando entre a linha da partida e a meta, procurando escutar o sinal para avançar para o guardar cá dentro e o colocar em pausa.

25 de junho de 2012


Vejo-te mas não te vejo bem. Não sei se acredito ou se sequer quero acreditar. Tu estás aqui, tu vieste do teu fim do mundo e surpreender-me fez parte do teu percurso e agora eu estou aqui, completa pelas minhas pessoas e/mas tu também aqui estás e eu não sei se me sinto contente, se me sinto pressionada, mas um sorriso maior nasce em mim e ajudado ou não por este líquido rosado bem gelado que se vai sumindo na minha mão, este sorriso vai-se tornando maior, contagiando olhos e gestos. E abraço-te, afinal sempre te abraço e parece tão natural, sai-me tão bem. E os gestos vão saindo cada vez mais a dois, numa sincronia que não está tão bem sincronizada como sequenciada, mas na qual os gestos e as palavras se vão ligando. E tu ligas-te, tu e as outras pessoas ligam-se e eu ligo-me também e tudo funciona num circuito simpático e cheio de sorrisos, palavras e gestos simpáticos. E gosto, começo a gostar das pessoas que giram à tua volta e apetece-me girar como elas, giram com elas e contigo, fazer parte desse circuito. E faço, prolongo a noite fazendo parte, tornando-me parte. Quando me torno parte colocamo-nos à parte e seguimos à parte de tudo o que gira em torno de nós. E nós giramos também. Talvez cada um de nós o faça por si mesmo mas a verdade é que o fazemos também a dois.
Vamos girando, mas vamos sincronizando, juntando, procurando encontrarmo-nos nesse trajeto. Ou não, talvez não, talvez só procuremos girar juntos porque assim o fazemos mais depressa. Depressa. Giramos depressa em conjunto mas ao pararmos de girar quebramos o conjunto e somos dois corpos soltos, pousados lado a lado, um de nós pensando no porquê, o outro adormecendo após o porque. Girámos e parámos e quando um de nós quer continuar a girar a presença do outro parado incomoda, como se ocupasse demasiado espaço e assim impedisse uma nova circunferência. Há um de nós que quer abanar o outro e falar sobre o porque para chegar ao porquê, mas quando o outro começa a girar em sentido contrário as circunferências não se cruzam mais, não é possível partilhar informação e ficamos cada vez mais distantes. Dois corpos soltos não pousados lado a lado mas dois corpos soltos caminhando em sentidos opostos.
O corpo solto que és tu quer ficar, o corpo solto que sou eu quer que vás, não por não querer que fiques mas por não saber o que fazer com a tua presença. Então circulas para longe, não te colocas mais à parte do circuito de que fazes parte, antes o reintegras. E eu assisto, ou queria assistir, ao mesmo tempo que circulo ora para a frente ora para trás, procurando reencontrar o rumo que, de girar tão depressa, se tornou pouco claro. E circulo, vou circulando, para a frente e para trás, por vezes nem chegando a circular mas apenas a balouçar suavemente, hesitante, procurando perceber que pessoa é esta que circula assim com vontade, girando depressa em direção a ti mas que questiona o porquê e evita o porque, ora empurrando ora puxando, procurando estabilizar a circunferência na vertical – e não na horizontal – num ponto a meio caminho do ir e do ficar, mas num ponto não horizontal, não horizontal com dois corpos pousados lado a lado mas vertical, com dois corpos circulando lado a lado, ou estabilizados lado a lado, mas lado a lado, na vertical.

21 de maio de 2012


Uma semana inteira como se estivesse bem.
Sento-me na cadeira (não muito) confortável, pouso as mãos delicadamente no colo (como que para completar o quadro de pessoa já muito equilibrada que tenho vindo a pintar para mim mesma), observo a janela com um brilhozinho nos olhos e abro a boca para uma qualquer conversa de circunstância pré-preparada na minha mente ao longo dos últimos dias.
De repente poderia ser só eu e a janela luminosa, só eu, a cadeira e os raios de sol que atravessam  a ganga das minhas calças, me tocam a pele e me aquecem de forma exagerada. Desejo que fôssemos só nós, objetos inanimados. As minhas mãos estão a apertar-se uma à outra enquanto eu me questiono (talvez em voz alta) porque estou ali, o que faço ali sentada, do que me vou queixar desta vez.
Mexe e remexe cá dentro e isso incomoda-me. Quero descalçar-me e caminhar descalça pelo chão (que imagino) frio; quero sentar-me à chinês daquela forma demasiadamente contorcida de que tanto gosto; quero gritar palavrões e perguntar o que raio estou eu ali a fazer. E as palavras ou as lágrimas, as palavras e as lágrimas, vão saindo por entre aquele nó que me aperta a garganta e me transforma num sussurro esganiçado. Choro por todas as coisas e inclusivamente choro por chorar, e choro por chorar o que não cheguei a ter e o que questiono se algum dia chegarei a ter. Choro o que não sabia ainda ter para chorar, choro as incógnitas da vida que deveria estar a celebrar, choro as inseguranças ou a falta de conhecimento desta vida que se me apresenta a cada dia.
E há toda uma tensão a transformar-se numa enorme dor de cabeça – não sei se para me avisar de que está a chegar se para me informar da sua partida.
Gostava que tivéssemos sido só nós: eu, a cadeira (não muito confortável) e a janela luminosa por onde entrava o sol que atravessava a ganga das minhas calças e me aquecia as pernas de forma exagerada. Gostava que tivéssemos sido só nós desta vez. Talvez da próxima – penso que ainda não.