(banda sonora para a leitura)
Se é para ir vai com tudo.
Sempre foi assim, sem meias medidas.
Aproximaste-te da beira e saltaste a pés juntos. Não olhaste em redor, não viste as marcas da profundidade, não espreitaste lá para baixo. Saltaste a pés juntos para o que havia de ser, sem saberes o que era, sem saberes o que querias que fosse.
Saltaste a pés juntos, de nariz tapado, respiração suspensa. Não inspiraste, não expiraste e até os olhos mantiveste fechados enquanto o teu corpo permanecia suspenso.
Saltaste a pés juntos cheia de convicção em direção ao vazio. Deixaste-te ficar, corpo esticado, em direção ao fundo. Abriste os olhos e o que viste não chegou para te tranquilizar. Não havia fim à vista, não havia uma beira a que te pudesses apoiar. Soltaste o nariz, soltaste os braços e as pernas. Soltaste a respiração. Abriste muito os olhos, procurando ver mais à frente, mais longe. E mexeste-te. Mexeste-te cheia de pressa, com o sangue a circular mais depressa nas veias, aquecendo-te a pele. Abriste e fechaste braços e pernas, afastando-te em direção a parte incerta. E subiste, subiste em direção à tona, subiste até que os teus olhos encontrassem a luz e as palmas das tuas mãos encontrassem a beira para, de uma só vez, ergueres todo o corpo e te soltares da água.
Arrefece-te a pele ao parares. Pontas dos dedos enrugadas, pernas que te tremem lá em baixo. Sempre foi assim, sem meias medidas.
Saltas a pés juntos uma e outra vez. Porque se é para ir então que seja com tudo. Uma e outra vez.
E a cada salto a tua pele vai-se tornando mais resistente à temperatura. Fria ou quente. Movimentas-te com mais pressa, mais medo, mais vontade. Crias uma camada protetora mas sabes que vais, que não ficas, que não deixas de saltar. Uma e outra vez. Saltas convicta. Saltas com tudo.
Porque, se é para ires, então vais com tudo. Em tudo.
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