Há novos hábitos que se criam quando tudo à nossa volta é diferente.
Aprendemos a viver mais para nós, mais connosco mesmos. Não dependemos tanto, não damos tanto. Fecham-se as portas depressa para que nada saia, nada entre. Aprendemos a ser por nós, a fazer para nós e por nós - sabendo que aqui essa é a força maior. Depois olhamos em redor, agarramo-nos ao que temos em redor, e valorizamos as pessoas. São as que se escolhem, as que fazem parte, a rede que nos suporta. São como que uma família.
Criam-se novos hábitos quando quem está à nossa volta é diferente.
Aprendemos novas línguas, novas regras. Respeitamos, com receio, as ordens dadas pelos bonequinhos verde e vermelho, cumprimos a preceito os hábitos da sociedade a que queremos pertencer.
Depois juntamos a família à volta da mesa e recuperamos os hábitos que deixámos lá longe, à distância. Abre-se uma garrafa de vinho - tinto - e inala-se com vontade o cheiro das carnes, dos enchidos. Negoceia-se quem trará na mala, na próxima viagem, o bacalhau para comer com as batatas - e vá, se as saudades apertarem, até com as couves. Salivamos ao pensar num peixe fresquinho grelhado no carvão.
Criam-se novos hábitos quando a família se constrói.
No computador, à hora do jantar há invariavelmente uma língua que é a nossa, as notícias de um país que é o nosso, de uma crise que - ainda que lá longe - temos ainda como nossa. Acompanha-se a atualidade como se ainda fizéssemos parte dela. Não se sabe se voltaremos a ser parte integrante, não sabemos sequer se queremos ou se só a crise não deixa que façamos. Torce-se mais pela seleção e pelo clube do coração em cafés em que a língua que falamos está em clara minoria.
Correm os dias com o hábito. Quer-se mais. Vive-se mais. Talvez se sofra menos - é que com o hábito tudo custa menos. Gosta-se até. Gosta-se mesmo.
E depois ouvimos um
- então até amanhã, Zé!
dito assim, com estas palavrinhas, e que nos transporta milhares de quilómetros, nos arranca um sorriso e nos aquece - nem que por um bocadinho - o coração.
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